domingo, 29 de abril de 2012

CRÔNICA SOBRE O USO DA LÍNGUA

Palavras, palavras, palavras
Sírio Possenti

Se você é professor de português (ou linguista), certamente já ouviu uma das seguintes perguntas: a) a palavra “x” existe? Como se escreve a palavra “y”? Qual é a pronúncia correta da palavra “z”? Qual o sentido da palavra “w”? Se você não é nem professor de português nem linguista (e mesmo sendo), certamente também já fez alguma dessas perguntas, ou todas. A razão para sua ocorrência constante é que elas são as questões mais comuns que ocorrem aos falantes curiosos em relação às palavras ou às possíveis palavras de uma língua.
Em geral, espera-se que haja para essas perguntas uma resposta categórica, do tipo sim-não (tal palavra existe, tal palavra não existe) ou tipo “a” ou “b” (a escrita correta é tal, a pronúncia correta é tal, o sentido da palavra é esse e não aquele). Essas respostas são certamente as esperadas, mas, invariavelmente, repostas categóricas como essas são problemáticas. Pelo menos, são frequentemente problemáticas. Respostas mais adequadas são de natureza diferente, mais ou menos como as seguintes: a) Se tal palavra existe? Depende. Você não acabou de dizê-la? Ouviu de quem? Ou: que eu sabia, não. Ou: é usada em tal região, e em tal profissão. Ou: existe, é uma palavra francesa (ou inglesa, ou da língua tal e tal). A pronúncia? No sul ou norte? Neste século ou no passado? No Brasil ou em Portugal (na Inglaterra ou nos Estados Unidos)? Como se escreve? Veja no dicionário, mas saiba que sua grafia já foi outra. Você viu essa palavra escrita de forma estranha? Quer saber por que isso ocorre? Bem, uma grafia errada tem muitas vezes boas explicações. O sentido da palavra? Ih, meu, agora ficou difícil. Em geral, as palavras significam tantas coisas! Você já olhou num dicionário? Já notou que é difícil encontrar palavras com um sentido só? Nunca olhou? Faça uma experiência: comece bem no começo. Bem no começo mesmo, no “a”. Você verá que nem mesmo o “a” é uma coisa só. Descobrirá o óbvio: que o “a” pode ser uma letra, uma preposição, um artigo, uma conjunção, uma vogal.
Estamos (ou estivemos) muito acostumados a uma ideia normativa da língua. Ela seria imóvel, imutável, fixa. Seria, ainda, um código perfeito. Por isso, cada pergunta deveria ter uma resposta só, e correta desde sempre e para sempre. Mas a realidade não é assim. Isso só poderia valer para uma língua inventada (e que não funcionaria de jeito nenhum). As línguas costumam ter alguns aspectos rigidamente organizados e outros móveis e variáveis. O princípio vale também para as palavras. Às vezes, é muito difícil decidir se uma palavra existe, ter certeza de sua pronúncia-padrão, ou ter outras certezas, qualquer uma.
Faça testes com palavras como “obeso”, “bandeja”, “caranguejo” etc. E não se esqueça de discutir a pronúncia de “subsistir”, por favor. Para saber o sentido das palavras, frequentemente temos que saber em que contexto foram usadas. Há muitas coisas interessantes sobre as palavras, além de sua impossível uniformidade e bom comportamento, que fomos acostumados a procurar descobrir. Aliás, é muito interessante olhar para elas como se olha para outros fenômenos da natureza. É mais instigante querer saber como se comportam de fato no mundo (o mundo de uma língua é seu uso por muitos falantes bastante diferenciados em numerosos contextos), do que querer congelá-las numa redoma.
1. In: Sírio Possenti. A cor da língua e outras croniquinhas de linguista. Campinas: Mercado de Letras, 2001, pp. 125-126.

sábado, 28 de abril de 2012

PAUTA DO CENTRO DE ESTUDOS INTEGRAL 25/04/2012


1.       Rio +20
·         Blog e comunidade no facebook do aluno Isaac (1902) - uma iniciativa
·         Projeto Heróis do Futuro da FIRJAN.
2.      Ponto facultativo dia 30/04. Dia 01/05 – feriado do Dia do trabalhador
3.      Planilha de Prova de Produção textual entrega das notas para dia 27/04. Estão disponibilizadas na internet.
4.      PROJETO: A BRIGADEIRO TEM HISTÓRIA
·         Início: 17/04 (Dia do aniversário da escola)
·         1ª atividade dia 18/05 (6ª feira) – faremos o bolo neste dia. Em breve seguirá o planejamento.
5.      Projeto de Sala de Leitura 2012 – Nossa vida dá história.
6.      O Projeto Amigos da escola terá o seu 1º dia temático também em 18/05. Será atrelado à nossa 1ª atividade do projeto.
7.      Lembrando: estamos recolhendo fotos de funcionários no ano de 1974.
8.      Assembléia e avaliação institucional: iniciamos com as turmas de 2º segmento. HAVERÁ AVALIAÇÃO DO BIMESTRE COM OS REPRESENTANTES DE TURMA
9.      Apesar da utilização dos Cadernos Pedagógicos não ser obrigatória é importante enfatizar a sua da utilização. Os responsáveis cobram a utilização do material entregue aos alunos com a justificativa de que é matéria da Avaliação da Rede.
10.   Utilizar-se sempre do relatório como respaldo. O diário de bordo é um bom instrumento.
11.    Chamada de professores novos (SME)
12.   Manter a leitura da pasta de circulares em dia e também dos e-mails
13.    “Recreio Legal”. Pesar em ações e iniciativas para fazer um recreio com menos barulho.
14.   Educopédia (problemas dos fios destruídos pela construtora GEOPORTANTE).
15.   Solicitamos o cuidado com o material e equipamentos:
·         Esta semana o filtro foi inutilizado, pois arrebentou a torneira.
16.   Chegou hoje, em 25/04 a nova funcionária residente, Liana, agente educadora lotada a E.M. Prof. Augusto Paulino Filho
17.   Conselho de classe:
·         1º segmento: 11/05 (6ª feira) – 8:00 / 13:00
·         2º segmento: 10/05 (5ª feira) – 8:00 / 13:00
18.   Listagens para digitação de notas. Passo-a-passo enviado por e-mail. Em breve as listagens do 1º segmento estarão on line.
19.   Há um erro no sequenciamento de chamada na turma 1602 - aluna: Gabriella Alves da Silva e na turma 1801 - aluno: Lucas Moraes da Taborda; os mesmos aparecem com numero 0 na relação. Observação: CRE ciente e Direção enviou backup para a informática. Estamos aguardado retorno.
20.  Na turma 1801 a aluna Natasha se afastou (maternidade), verificar trabalhos para que ela possa ser avaliada no próximo COC.
                       

domingo, 15 de abril de 2012

APRENDIZAGEM NA ERA DIGITAL


A Educação em tempos de Control C e Control V

Como o “copiar e colar” da internet interferem no aprendizado das crianças e adolescentes nas escolas? Quais são os prejuízos? Há benefícios?
João Luís de Almeida Machado



Nos anos 1970 e 1980 era comum que as famílias brasileiras fossem visitadas por vendedores de enciclopédias. Coleções de livros que traziam informações sobre todos os assuntos que interessavam aos pais e a seus filhos, neste caso, em especial para atender a trabalhos e pesquisas escolares. Barsa, Delta Larousse, Conhecer e tantas outras destas coleções ficaram bastante conhecidas e, além de presentes nas casas das pessoas, eram também encontradas em bibliotecas públicas e escolares.

A partir do momento em que uma tarefa escolar que exigia pesquisa era demandada pelos professores estes instrumentos do conhecimento eram logo acessados. Os alunos buscavam verbetes em suas páginas, liam o conteúdo, retiravam as ideias mais importantes - ou aproveitavam todo o conteúdo, e colocavam no papel. Dependendo do grau de maturidade dos alunos ou da série (ano escolar) em que se encontravam, muitos professores pediam que o conteúdo não fosse apenas uma cópia, mas sim uma seleção de informações que gerasse textos mais personalizados.
Nem todos os professores assim o faziam, é claro. Assim como, mesmo quando isso era pedido, muitos alunos, por motivos variados (preguiça, dificuldade, desorganização, por deixarem para a última hora...), ou não faziam ou quando realizavam esta releitura, a faziam apenas de modo acumprir tabela, ou seja, pró-forme. De qualquer modo, era esse o ensejo, o caminho, a trajetória percorrida por muitos estudantes daquelas décadas, guiados por suas enciclopédias.
Estes livros, por sinal, constituem um desejo humano tão antigo quanto a Bíblia e outros livros sagrados parecem expressar: A ideia de que nas páginas de uma publicação pudesse estar contida toda a sabedoria do mundo ou, pelo menos, a forma como nós conseguimos deduzir e interpretar tudo o que nos cerca. Arte, ciência, filosofia, matemática, literatura, música, história, educação, saúde e tudo o mais em forma de letras e imagens. Decodificado pela mente humana e colocado dentro de linguagem acessível que permita o acesso ao conhecimento a todos os mortais.
Este conceito veio a tomar forma e corpo, no modelo que conhecemos hoje, durante o movimento pré-revolucionário francês do século XVIII. Constitui uma das espinhas dorsais do Iluminismo ou Revolução das Luzes. Seus artífices foram os pensadores Denis Diderot e Jean D’Alembert que, no ensejo de legar a população de seu país (e do mundo) o direito legítimo de conhecer, de saber, de ter contato com a ciência, as artes e todas as áreas do conhecimento, produziram sua Enciclopédia. Atribuíram a alguns dos grandes nomes da época, como Voltaire e Rousseau, o compromisso de escrever alguns destes verbetes.
Na Era da Informação que estamos vivendo agora, com o advento da internet e outras tecnologias, as enciclopédias em papel parecem ter perdido o próprio sentido de existência. Há “organismos vivos” em gestação (em rede) que suprem, literalmente, a falta de todos aqueles livros. É possível, por exemplo, acessar a Wikipedia, atualizada diariamente em inúmeras línguas, e pesquisar dados sobre todos os assuntos de uma coleção como a Barsa e, ainda, encontrar muitos outros temas não abarcados em seus vários volumes.
Basicamente, no entanto, ainda que enriquecido por mídias como vídeos, podcasts, imagens e/ou infográficos, as enciclopédias digitais, ou mesmo as páginas resultantes de pesquisas em mecanismos de busca como o Google são apenas ferramentas, meios ou plataformas para se chegar à informação. Não são tão diferentes, portanto, dos livros e, de modo mais específico, as enciclopédias.
A relação das pessoas e, no caso, dos estudantes com a pesquisa em enciclopédias de papel ou em suas versões virtuais pode parecer, num primeiro momento, a mesma. O que faziam os estudantes da década de 1970 ao ler, selecionar trechos, reproduzir ou realizar uma releitura dos mesmos em suas produções para projetos e tarefas escolares não seria, neste sentido, o mesmo que hoje com a Wikipedia ou com o Google e seus resultados de busca. Será?
Na realidade, a ideia primordial é a mesma, ou seja, a da busca de informações para compor conhecimento, enriquecer saberes, realizar pontes inteligando conteúdos e leituras de sala de aula com novos autores, fatos e dados.
Há, no entanto, diferenças primordiais. Por exemplo, a leitura na internet tende a ser muito mais rápida e, assim sendo, menos criteriosa ou preocupada em entender as minúcias do texto, buscar suas conexões. A leitura, muitas vezes, pode até mesmo se restringir ao título, subtítulo e linhas iniciais, para saber se contempla a pesquisa demandada em sala de aula. É comum, em diferentes níveis de ensino, que os professores se defrontem com “trabalhos” supostamente de autoria de seus alunos nos quais há menções a outros estudantes, escolas e épocas...
A leitura criteriosa passa a ser, neste sentido, uma meta a ser atingida quando se propõe aos alunos pesquisas a serem realizadas na web e que venham a compor material para seus projetos. Isso pode ser atingido se os alunos são informados desde o princípio que, de algum modo, serão questionados quanto ao conteúdo do trabalho realizado, seja em aula ou em avaliações. É preciso que fique claro a todos os alunos que o professor leu (ou lerá) sua composição e que ela de algum modo poderá ser referenciada ou utilizada em questionamentos direcionados a ele ou a toda a turma.
A própria leitura do trabalho pelo professor, muitas vezes esmagado por uma grande carga de atividades a realizar em aula e também fora da escola, muitas vezes acaba fazendo com que sua correção seja rápida e que, com isso, não se percebam situações como reprodução de materiais da internet disfarçadas. O comprometimento do professor na correção dos trabalhos é uma forma muito eficaz de se combater esta ou qualquer outra ação indevida dos alunos. Sua leitura atenta e correção minuciosa permitem devolutivas plenas aos alunos e lhes transmite a ideia de que o docente está muito sintonizado, comprometido e engajado com o processo de ensino-aprendizagem que realiza e com a formação de seus pupilos.
Além da leitura com foco e condição de articulação em relação aos saberes trabalhados em aula, o trato da informação obtida no mundo virtual, ao ocorrer mecanicamente através do copiar e colar não oportuniza para o aluno a seleção de informações e, principalmente, a organização das ideias no papel.
A seleção de ideias é, muitas vezes, descartada ou substituída pela escolha aleatória de alguns trechos, com o intuito de compor a esperada tarefa que foi pedida. Isso quando não ocorre simplesmente a cópia e colagem de todo o material encontrado num site ou portal. O processo de escolha criteriosa de dados infere relacionar com o que foi estudado anteriormente, a leituras indicadas, a tarefas pedidas, a explanações do(s) docente(s) daquele ano ou de etapas anteriores do ensino. É, portanto, uma ação de racionalização, organização, construção e elaboração dos saberes e, como tal, não pode ser desprezada ou relegada a segundo plano.
Organizar as ideias no papel, por sua vez, é a parte do trabalho em que o estudante tem que dar aos recortes sobre as temáticas em estudo (trazidas pelas leituras, aulas e pesquisas on-line e off-line) a sua compreensão de todo este montante de dados. A isto trará, como contribuição e elemento de aglutinação o seu conhecimento de mundo, pautado em experiências e leituras que fez ao longo da vida e que lhe são próprias e únicas. Além disso, estará praticando a escrita, a organização das informações, enriquecendo o vocabulário e definindo a sua forma de escrever e de se comunicar através das letras.
Neste sentido, é praticamente um imperativo para o professor - ao pedir pesquisas, trabalhos ou qualquer tipo de projeto que demande levantamentos por parte dos alunos – que se estipulem metas além da simples busca de conteúdos. Os docentes precisam orientar o trabalho de pesquisa e almejar, além dos conteúdos adicionados, que também sejam atingidos objetivos como:
- Busca pelas melhores fontes;
- Utilização de mais de uma fonte;
- Uso de referências virtuais e também físicas;
- Leitura criteriosa e focada;
- Seleção das ideias mais importantes dos materiais pesquisados;
- Comparação/aproximação das ideias lidas com as aulas e materiais usados em sala de aula;
- Rascunho ou esboço do que irá escrever e levar para a aula;
- Enriquecimento do vocabulário e melhor conhecimento das regras gramaticais;
- Escolha de imagens, gráficos, tabelas ou outros materiais visuais que ajudem a tornar mais clara a ideia do projeto;
- Valorização de saberes que já possui quanto ao assunto (leituras e experiência de vida) e que possam ajudar a compor seu projeto;
- Desenvolvimento da escrita quanto às técnicas e também em busca de seu próprio estilo e forma de comunicar-se através das letras;
 Isso não significa dizer que não existam pontos positivos na pesquisa on-line, pelo contrário, sua agilidade e a disponibilização de base de dados e informações que vem de todo o mundo é um grande adendo para a educação. No entanto, o que não pode acontecer é o uso acrítico e inconsistente, ou seja, sem que o aluno pense seus procedimentos, os conteúdos por ele escolhidos e mesmo, que realize apenas um ato mecânico de copiar e colar para apenas atender uma demanda de seus professores... Neste sentido vale sempre destacar que a educação tem que ser, sempre, significativa para o aluno, ou seja, vinculada ao seu mundo, associada ao que ele vive ou viverá, sendo capaz, desta forma, de fazer com que tudo para ele no processo de ensino-aprendizagem seja realmente motivador e desafiador!

TEXTO SOBRE DIADÁTICA DA MATEMÁTICA

Uma reflexão sobre o uso de materiais concretos e jogos no Ensino da Matemática
Dario Fiorentini e
Maria Ângela Miorim
Docentes da Faculdade de Educação da UNICAMP
Publicado no Boletim SBEM-SP
Ano 4 - nº 7
As dificuldades encontradas por alunos e professores no processo ensino-aprendizagem da matemática são muitas e conhecidas. Por um lado, o aluno não consegue entender a matemática que a escola lhe ensina, muitas vezes é reprovado nesta disciplina, ou então, mesmo que aprovado, sente dificuldades em utilizar o conhecimento "adquirido", em síntese, não consegue efetivamente ter acesso a esse saber de fundamental importÂncia.
O professor, por outro lado, consciente de que não consegue alcançar resultados satisfatórios junto a seus alunos e tendo dificuldades de, por si só, repensar satisfatoriamente seu fazer pedagógico procura novos elementos - muitas vezes, meras receitas de como ensinar determinados conteúdos - que, acredita, possam melhorar este quadro. Uma evidência disso é, positivamente, a participação cada vez mais crescente de professores nos encontros, conferências ou cursos.
                              
São nestes eventos que percebemos o grande interesse dos professores pelos materiais didáticos e pelos jogos. As atividades programadas que discutem questões relativas a esse tema são as mais procuradas. As salas ficam repletas e os professores ficam maravilhados diante de um novo material ou de um jogo desconhecido. Parecem encontrar nos materiais a solução - a fórmula mágica- para os problemas que enfrentam no dia-a-dia da sala de aula.
O professor nem sempre tem clareza das razões fundamentais pelas quais os materiais ou jogos são importantes para o ensino-aprendizagem da matemática e, normalmente são necessários, e em que momento devem ser usados.
Geralmente costuma-se justificar a importÂncia desses elementos apenas pelo caráter "motivador" ou pelo fato de se ter "ouvido falar" que o ensino da matemática tem de partir do concreto ou, ainda, porque através deles as aulas ficam mais alegres e os alunos passam a gostar da matemática.
                                       
Entretanto, será que podemos afirmar que o material concreto ou jogos pedagógicos são realmente indispensáveis para que ocorra uma efetiva aprendizagem da matemática?
Pode parecer, a primeira vista, que todos concordem e respondam sim a pergunta. Mas isto não é verdade. Um exemplo de uma posição divergente é colocada por Carraher & Schilemann (1988), ao afirmarem, com base em suas pesquisas, que "não precisamos de objetos na sala de aula, mas de objetivos na sala de aula, mas de situações em que a resolução de um problema implique a utilização dos princípios lógico-matemáticos a serem ensinados" (p. 179). Isto porque o material"apesar de ser formado por objetivos, pode ser considerado como um conjunto de objetos 'abstratos' porque esses objetos existem apenas na escola, para a finalidade de ensino, e não tem qualquer conexão com o mundo da criança" (p. 180). Ou seja, para estes pesquisadores, o concreto para a criança não significa necessariamente os materiais manipulativos, mas as situações que a criança tem que enfrentar socialmente.
As colocações de Carraher & Schilemann nos servem de alerta: não podemos responder sim aquelas questões sem antes fazer uma reflexão mais profunda sobre o assunto.
Com efeito, sabemos que existem diferentes propostas de trabalho que possuem materiais com características muito próprias, e que os utilizam também de forma distinta e em momentos diferentes no processo ensino-aprendizagem.
Qual seria a razão para a existência desta diversidade?
Na verdade, por trás de cada material, se esconde uma visão de educação, de matemática, do homem e de mundo; ou seja, existe, subjacente ao material, uma proposta pedagógica que o justifica.
                                         

O avanço das discussões sobre o papel e a natureza da educação e o desenvolvimento da psicologia, ocorrida no seio das transformações sociais e políticas contribuíram historicamente para as teorias pedagógicas que justificam o uso na sala de aula de materiais "concretos" ou jogos fossem, ao longo dos anos, sofrendo modificações e tomando feições diversas.
Até o séc. XVI, por exemplo, acreditava-se que a capacidade de assimilação da criança era idêntica ã do adulto, apenas menos desenvolvida. A criança era considerada um adulto em miniatura. Por esta razão, o ensino deveria acontecer de forma a corrigir as deficiências ou defeitos da criança. Isto era feito através da transmissão do conhecimento. A aprendizagem do aluno era considerada passiva, consistindo basicamente em memorização de regras, formulas, procedimentos ou verdades localmente organizadas. Para o professor desta escola - cujo o papel era o de transmissor e expositor de um conteúdo pronto e acabado - o uso de materiais ou objetos era considerado pura perda de tempo, uma atividade que perturbava o silêncio ou a disciplina da classe. Os poucos que os aceitavam e utilizavam o faziam de maneira puramente demonstrativa, servindo apenas de auxiliar a exposição, a visualização e memorização do aluno. Exemplos disso são: o flanelógrafo, as réplicas grandes em madeira de figuras geométricas, desenhos ou cartazes fixados nas paredes... Em síntese, estas constituem as bases do chamado "Ensino Tradicional" que existe até hoje em muitas de nossas escolas.
 
Já no séc. XVII, este tipo de ensino era questionado. Comenius (1592-1671) considerado o pai da Didática, dizia em sua obra "Didática Magna" (1657) que "...ao invés de livros mortos, por que não podemos abrir o livro vivo da natureza? Devemos apresentar a juventude as próprias coisas, ao invés das suas sombras" (Ponce, p.127).
No séc. XVIII, Rousseau (1727 - 1778), ao considerar a Educação como um processo natural do desenvolvimento da criança, ao valorizar o jogo, o trabalho manual, a experiência direta das coisas, seria o percursor de uma nova concepção de escola. Uma escola que passa a valorizar os aspectos biológicos e psicológicos do aluno em desenvolvimento: o sentimento, o interesse, a espontaneidade, a criatividade e o processo de aprendizagem, as vezes priorizando estes aspectos em detrimento da aprendizagem dos conteúdos.
Ë no bojo dessa nova concepção de educação e de homem que surgem, primeiramente, as propostas de Pestalozzi (1746 - 1827) e de seu seguidor Froebel (1782 - 1852). Estes foram os pioneiros na configuração da "escola ativa". Pestalozzi acreditava que uma educação seria verdadeiramente educativa se proviesse da atividade dos jovens. Fundou um internato onde o currículo adotado dava ênfase à atividades dos alunos como canto, desenho, modelagem, jogos, excursões ao ar livre, manipulação de objetos onde as descrições deveriam preceder as definições; o conceito nascendo da experiência direta e das operações sobre as coisas [ 4, pp. 17 - 18].
                                          

Posteriormente, Montessori (1870 - 1952) e Decroly (1871 - 1932), inspirados em Pestalozzi iriam desenvolver uma didática especial (ativa) para a matemática.
A médica e educadora italiana, Maria Montessori, após experiências com crianças excepcionais, desenvolveria, no início deste século, vários materiais manipulativos destinados a aprendizagem da matemática. Estes materiais, com forte apelo a "percepção visual e tátil", foram posteriormente estendidos para o ensino de classes normais. Acreditava não haver aprendizado sem ação: "Nada deve ser dado a criança, no campo da matemática, sem primeiro apresentar-se a ela uma situação concreta que a leve a agir, a pensar, a experimentar, a descobrir, e daí, a mergulhar na abstração" (Azevedo, p. 27)
Entre seus materiais mais conhecidos destacamos: "material dourado", os "triÂngulos construtores" e os "cubos para composição e decomposição de binômios, trinômios".
Decroly, no entanto, não põe nada na mão da criança materiais para que ela construa mas sugere como ponto de partida fenômenos naturais (como o crescimento de uma planta ou a quantidade de chuva recolhida num determinado tempo, para por exemplo, introduzir medições e contagem). Ou seja, parte da observação global do fenômeno para, por análise, decompô-lo.
Castelnuovo (1970) denomina o método Decroly de "ativo - analítico" enquanto que o de Montessori de "ativo - sintético" (sintético porque construtivo). Em ambos os métodos falta, segundo Castelnuovo, uma "certa coisa" que conduz a criança à indução própria do matemático. é com base na teoria piageteana que aponta para outra direção: A idéia fundamental da ação é que ela seja reflexiva..."que o interesse da criança não seja atraído pelo objeto material em si ou pelo ente matemático, senão pelas operações sobre o objeto e seus entes. Operações que, naturalmente, serão primeiro de caráter manipulativo para depois interiorizar-se e posteriormente passar do concreto ao abstrato. Recorrer a ação, diz Piaget, não conduz de todo a um simples empirismo, ao contrário, prepara a dedução formal ulterior, desde que tenha presente que a ação, bem conduzida, pode ser operatória, e que a formalização mais adiantada o é também" [4, pp. 23-28].

                                          
Assim interpreta Castelnuovo, o 'concreto' deve ter uma dupla finalidade : "exercitar as faculdades sintéticas e analíticas da criança" ; sintética no sentido de permitir ao aluno construir o conceito a partir do concreto; analítica por que, nesse processo, a criança deve discernir no objeto aqueles elementos que constituem a globalização. Para isso o objeto tem de ser móvel, que possa sofrer uma transformação para que a criança possa identificar a operação - que é subjacente [4, pp. 82 - 91]
Resumindo, Castelnuovo defende que "o material deverá ser artificial e também ser transformável por continuidade" (p. 92). Isto porque recorrermos aos fenômenos naturais, como sugere Decroly, nele há sempre continuidade, porém, são limitados pela própria natureza e não nos levam a extrapolar, isto é, a idealizar o fenômeno por outro lado, podem conduzir ã idéia de infinito, porem lhes faltam o caráter de continuidade e do movimento (p. 92).
Para contrapor ao que acabamos de ver, gostaríamos de dizer algumas palavras sobre outra corrente psicológica: o behaviorismo, que também apresenta sua concepção de material, e principalmente, de jogo pedagógico. Segundo Skinner (1904), a aprendizagem é uma mudança de comportamento (desenvolvimento de habilidades ou mudanças de atitudes) que decorre como resposta a estímulos esternos, controlados por meio de reforços. A matemática, nesta perspectiva, é vista, muitas vezes, como um conjunto de técnicas, regras, fórmulas e algoritmos que os alunos tem de dominar para resolver os problemas que o mundo tecnológico apresenta.
Os Métodos de ensino enfatizam, além de técnicas de ensino como instrução programada (estudo através de fichas ou módulos instrucionais) o emprego de tecnologias modernas audiovisuais (retroprojetor, filmes, slides ...) ou mesmo computadores.
Os jogos pedagógicos, nesta tendência, seriam mais valorizados que os materiais concretos. Eles podem vir no início de um novo conteúdo com a finalidade de despertar o interesse da criança ou no final com o intuito de fixar a aprendizagem e reforçar o desenvolvimento de atitudes e habilidades.
                                      
Para Irene Albuquerque (1954) o jogo didático "..,serve para fixação ou treino da aprendizagem. é uma variedade de exercício que apresenta motivação em si mesma, pelo seu objetivo lúdico... Ao fim do jogo, a criança deve ter treinado algumas noções, tendo melhorado sua aprendizagem" (p. 33)
Veja também a importÂncia dada ao jogo na 'formação educativa' do aluno "... através do jogo ele deve treinar honestidade, companheirismo, atitude de simpatia ao vencedor ou ao vencido, respeito as regras estabelecidas, disciplina consciente, acato às decisões do juiz..." (Idem, p. 34)
Esta diversidade de concepções acerca dos materiais e jogos aponta para a necessidade de ampliar nossa reflexão.
Queremos dizer que, antes de optar por um material ou um jogo, devemos refletir sobre a nossa proposta político-pedagógica; sobre o papel histórico da escola, sobre o tipo de aluno que queremos formar, sobre qual matemática acreditamos ser importante para esse aluno.
O professor não pode subjugar sua metodologia de ensino a algum tipo de material porque ele é atraente ou lúdico. Nenhum material é válido por si só. Os materiais e seu emprego sempre devem, estar em segundo plano. A simples introdução de jogos ou atividades no ensino da matemática não garante uma melhor aprendizagem desta disciplina.
Ë freqüente vermos em alguns professores uma mistificação dos jogos ou materiais concretos. Até mesmo na Revista "Nova Escola" esta mistificação, pode ser percebida como mostra o seguinte fragmento: "Antes a matemática era o terror dos alunos. Hoje ... as crianças adoram porque se divertem brincando, ao mesmo tempo que aprendem sem decoreba e sem traumas..." Mariana Manzela (8 anos) confirma isto : "é a matéria que eu mais gosto porque tem muitos jogos" [ No.39, p. 16].
                                    
Ora, que outra função tem o ensino de matemática senão o ensino da matemática? Ë para cumprir esta tarefa fundamental que lançamos mão de todos os recursos que dispomos.
Ao aluno deve ser dado o direito de aprender. Não um 'aprender' mecÂnico, repetitivo, de fazer sem saber o que faz e por que faz. Muito menos um 'aprender' que se esvazia em brincadeiras. Mas um aprender significativo do qual o aluno participe raciocinando, compreendendo, reelaborando o saber historicamente produzido e superando, assim, sua visão ingênua, fragmentada e parcial da realidade.
O material ou o jogo pode ser fundamental para que isto ocorra. Neste sentido, o material mais adequado, nem sempre, será o visualmente mais bonito e nem o já construído. Muitas vezes, durante a construção de um material o aluno tem a oportunidade de aprender matemática de forma mais efetiva.
Em outro momentos, o mais importante não será o material, mas sim, a discussão e resolução de uma situação problema ligada ao contexto do aluno, ou ainda, à discussão e utilização de um raciocínio mais abstrato.
Bibliografias
1. ALBUQUERQUE, Irene de. Metodologia da Matemática. Rio de Janeiro : Ed. Conquista, 1953
2. AZEVEDO, Edith D. M. Apresentação do trabalho Montessoriano. In: Ver. de Educação & Matemática no. 3, 1979 (pp. 26 - 27)
3. CARRAHER, T. N. Na vida dez, na escola zero. São Paulo: Cortez, 1988.
4. CASTELNUOVO, E. Didática de la Matemática Moderna. México: Ed. Trillas, 1970
5. DIENNES, Z. P. Aprendizado moderno da matemática. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1970
6. PONCE, Aníbal. Educação e luta de classes. São Paulo: Cortez, 1985.
7. SAVIANI, D. Escola e democracia. São Paulo: Cortez 1985.